COVID-19 – Necessidade de prorrogação extraordinária de atos concessórios de drawback

Rafael Platini Neves de Farias

Ferramenta já amplamente conhecida pelos exportadores brasileiros, o Drawback consiste em regime aduaneiro especial que possibilita a suspensão ou eliminação de tributos (Imposto de Importação, do IPI, PIS/COFINS, ICMS, AFRMM) incidentes sobre insumos importados ou adquiridos no mercado interno para emprego ou consumo na industrialização de produto a ser exportado.

Trata-se de um incentivo às exportações, pois reduz os custos de produção de produtos exportáveis, tornando-os mais competitivos no mercado internacional, com reflexos bastante positivos na balança comercial brasileira, especialmente com o cenário atual de alta do dólar, contribuindo também para manutenção e fortalecimento do parque industrial nacional.

Com a abertura do ato concessório, a empresa beneficiária apresenta uma estimativa de insumos que irá importar sem o recolhimento dos tributos, se comprometendo a exportar determinada quantidade de produtos, observado o prazo máximo concedido pelo regime.

Nos termos da Portaria SECEX nº 23/2011, o prazo de validade do ato concessório é de um ano, podendo ser solicitada prorrogação, desde que devidamente justificada e examinadas as peculiaridades do caso, respeitado o limite de dois anos da data de emissão do respectivo ato concessório.

Ultrapassados os prazos acima sem que tenha adimplido o compromisso de exportação nas quantidades indicadas, a empresa necessariamente deve adotar uma das medidas disciplinadas na Portaria SECEX nº 23/2011, que consistem em: a) devolução ao exterior da mercadoria importada não utilizada; b) destruição das mercadorias, sob controle aduaneiro; c) destinação para consumo das mercadorias remanescentes, com o pagamento dos tributos suspensos e acréscimos legais devidos; d) entrega da mercadoria importada à Fazenda Nacional livres de quaisquer despesas e ônus, desde que a autoridade aduaneira concorde em recebê-las.

Como se observa, todas as opções legais nos casos em que a empresa esteja impossibilitada de adimplir o compromisso de exportação assumido são bastante gravosas, pois resultam no perdimento dos insumos ou na necessidade de internalização, com pagamento de todos os tributos antes suspensos ou isentos e acréscimos legais.

Essa última hipótese em uma primeira leitura pode aparentar ser de menos impacto, pois a empresa poderia destinar os insumos a produção de mercadoria para clientes do mercado interno.
Entretanto, essa não é a realidade da grande maioria das empresas, especialmente daquelas com produção voltada exclusivamente para o exterior.

Isso porque, as empresas se valem do Drawback com o objetivo primordial de exportar os valores e quantidades de produtos compromissados dentro prazo. Quando não é possível cumprir o compromisso no prazo fixado, os prejuízos são evidentes – com exceção de poucas empresas que conseguem remanejar os insumos para o mercado interno – pois terão que incorporar os produtos nos seus estoques, com pagamento de todos os tributos de importação; bem como terão que exportar os produtos mantendo a métrica de valor pactuada nos contratos internacionais ou então perdendo valor e competitividade em novos contratos, já que há o incremento do custo tributário dos insumos importados em razão da não exportação no prazo do ato concessório.

Como a fixação do prazo de exportação está relacionado ao ciclo do produto a ser exportado, em condições normais de mercado as empresas conseguem adimplir os compromissos de exportação nos prazos fixados nos respectivos atos concessórios, mantendo a supressão dos tributos incidentes na importação dos insumos.

Com o atual contexto mundial de pandemia do Coronavírus e de aprofundamento da crise econômica, diversos Países já anunciariam perspectivas negativas de crescimento e desaceleração das atividades econômicas, gerando inevitável recessão global.

Além dos prejuízos internos de toda cadeia industrial e comercial, a crise tem como efeito nas empresas exportadoras a drástica redução de pedidos e novas encomendas, havendo também cancelamentos de várias operações comerciais de aquisição já contratadas, o que reflete invariavelmente na impossibilidade de cumprimento dos compromissos de exportação fixados nos atos concessórios de Drawback.

Nesse cenário, é importante e urgente que Governo e Congresso adotem medidas para viabilizar a prorrogação dos prazos para adimplemento dos compromissos de exportação dos atos concessórios em curso, como forma de mitigar os prejuízos das empresas exportadoras e os reflexos negativos diretos e indiretos no fluxo de caixa, contratos, na atividade industrial e nos empregos.

Vale destacar que a prorrogação do prazo para cumprimento dos atos concessórios não representa nenhum custo adicional para o Governo, pois trata de desoneração já prevista anteriormente no orçamento. Por outro lado, certamente irá possibilitar que as empresas exportadoras tenham mais tempo para venda de sua produção no exterior, com a busca de novos compradores e a superação do COVID-19, sendo retomado o crescimento econômico.

Essa postura governamental já foi adotada anteriormente no contexto da crise econômica iniciada em 2008, cujos efeitos certamente foram menores do que o que se projeta na crise atual. Nesse sentido, destacamos o art. 13 da Lei nº 11.945/2009, resultado da conversão da Medida Provisória 451/2008, e art. 16, da Lei nº 12.995/2014, resultado da conversão da Medida Provisória 634/2013.

Por fim, as empresas que possuam atos na iminência de vencimento podem avaliar a apresentação de medida judicial para prorrogação excepcional do prazo, tendo por base: i) a situação inequívoca, abrupta e inesperada crise global por conta do COVID-19, com prejuízos financeiros e de fluxo de caixa para pagamento dos tributos incidentes na importação dos insumos; ii) o Decreto Legislativo nº 6/2020, que reconhece a ocorrência do estado de calamidade pública; iii) art. 170, III, da CF, arts. 108, III, e art. 151, IV, do CTN, art. 98, da Portaria SECEX nº 23/2011, ainda que por analogia.